domingo, 4 de novembro de 2012

Com usina em Sorocaba, País fechará elo da reciclagem de eletrônicos

Atualmente, o processamento dos metais é feito no exterior; Brasil produz anualmente quase 100 mil toneladas de lixo eletrônico

No primeiro semestre de 2013, a cidade de Sorocaba, em São Paulo, deve receber a primeira usina do País a realizar o último elo da reciclagem de eletroeletrônicos - o processamento dos metais, que atualmente é feito no exterior. Além de abrir caminho para a exploração da chamada mineração urbana, o projeto Sinctronics promete facilitar a reinserção na cadeia de consumo das quase 100 mil toneladas de lixo eletrônico anuais produzidos no País.

Atualmente, quase todo o metal presente nesses resíduos é descartado incorretamente com os aparelhos ou acaba exportado para países como Bélgica, Grã-Bretanha e Alemanha, que dispõem de tecnologia avançada para fazer o processamento.
"O Sinctronics será o primeiro ecossistema integrado de soluções sustentáveis para o mercado eletroeletrônico no Brasil, atendendo a uma cadeia produtiva de ponta a ponta", diz Kami Saidi, diretor de operações e líder do Programa Integrado de Sustentabilidade da HP, cliente e parceira do projeto. A parte tecnológica fica a cargo da Flextronics, gigante de Cingapura do ramo de eletrônicos que possui fábrica em Manaus.
Segundo Saidi, inicialmente será possível fazer a reciclagem de 250 toneladas por mês de plástico - que representa 45% dos aparelhos celulares, um dos eletrônicos mais abundantes (quase 250 milhões de unidades no País) e de vida útil mais reduzida (22 meses, em média).
A novidade, no entanto, será mesmo a extração dos metais, cujo potencial não é revelado. De olho no alto valor dos minérios, as empresas envolvidas esperam lucrar com o lixo eletrônico. Estima-se que para cada tonelada seja possível extrair entre 200g e 300g de ouro (veja infográfico). Outros metais menos nobres, como o cobre, o bronze, o alumínio e o ferro, retornariam à cadeia produtiva.
"Em Sorocaba será possível reciclar todos os tipos e quaisquer marcas de eletrônicos", diz Saidi. "O produto que será mais reciclado dependerá da demanda de devolução do mercado."
Além da Flextronics, a Cimelia, outra empresa com sede em Cingapura, cogita fazer a extração de metais em território brasileiro. Atualmente, ela exporta até 400 toneladas de lixo eletrônico por mês para serem processadas no país asiático.
Estímulo. Empresas e entidades ligadas ao setor de eletrônicos esperam que iniciativas como essa tragam incrementos a toda a cadeia de reciclagem de eletrônicos, cujo maior problema é a falta de um ciclo constante - segundo dados divulgados pelo Ministério do Meio Ambiente, cerca de 500 milhões de aparelhos sem uso no País estão guardados em residências.
A necessidade de exportar as partes metálicas para outros países apenas dificulta o processo. "Está faltando no País o fechamento do ciclo, pois ainda é muito caro para as empresas reciclarem", afirma Roberto Lucena, dono da Eco-Cel, especializada na coleta de celulares usados e encaminhamento para destinação adequada.
Com 400 urnas espalhadas em locais de grande circulação, como shoppings, farmácias e academias da cidade de São Paulo, a empresa de Lucena faz a coleta a cada 30 ou 35 dias e recolhe até 3 mil aparelhos por mês.
A Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), que há um ano lançou na capital um projeto permanente com oito pontos de descarte de lixo eletrônico, afirma que é preciso multiplicar esses locais.
"Há poucos pontos de descarte, e eles não abrangem toda a cidade. Ninguém fica rodando a cidade com lixo no porta-malas em busca de um local", diz o diretor executivo da Abrelpe, Carlos Silva Filho. Segundo ele, a entidade planejar ampliar para 30 os pontos de descarte até o fim de 2013.
BRUNO DEIRO - O Estado de S.Paulo - 28 de outubro de 2012 | 3h 07

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Gestão de resíduos sólidos, um desafio para os novos prefeitos


Terminada a última etapa das eleições municipais, é chegada a hora de os novos prefeitos interromperem as comemorações e começar a agir para atender as expectativas de seus eleitores. Entre os inúmeros desafios que estarão à frente da administração das cerca de 5.600 cidades brasileiras está a gestão dos resíduos. Como veremos mais à frente são poucos os municípios que encaram esse problema com a urgência e relevância que o assunto faz por merecer.

Ninguém é capaz de negar a importância de termos uma gestão mais correta e eficiente dos resíduos como a estabelecida na proposta da Política Nacional de Resíduos Sólidos- http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/lei/l12305.htm. Também é muito difícil desconsiderar os enormes obstáculos para se conseguir a sua efetiva implementação.

Para começo de conversa com a nova Lei de Resíduos Sólidos, o lixo deixa de ser lixo para virar resíduo. E, esse tal resíduo, deverá ter um destino muito mais nobre que o pobre lixo jogado por aí, sem qualquer serventia. Resíduo é material valioso para ser usado novamente na cadeia produtiva, pronto para ser reaproveitado, reutilizado, reciclado e não mais descartado. Do plebeu lixo para o nobre resíduo. Do imprestável para se transformar em insumo essencial.

Sabe aquele catador de lixo, em sua maioria, subempregado e trabalhando em condições no mínimo pouco favoráveis? Pois esses profissionais irão receber o valor que merecem quando a lei estiver plenamente em vigor. Eles serão reconhecidos pelo serviço essencial que exercem para toda a sociedade e para a manutenção de um meio ambiente mais saudável.

A lei também determina, como uma de suas premissas mais importantes, a responsabilidade compartilhada, ou seja, será preciso a participação de todos para o alcance de seus objetivos. Setores público e privado, sociedade civil, cidadãos e como citado acima, dos catadores de material reciclável (notem que não mais os chamamos de catadores de lixo) necessariamente vão ter de fazer parte da mesma equação. Dependerá dessa união o sucesso ou o fracasso da lei.

Portanto, no bojo da Política de Resíduos Sólidos, estão propostas pequenas e virtuosas revoluções capazes de trazer enormes quebras de paradigma e grandes alterações no comportamento social.

Obviamente, se existem tantas novas situações por assim dizer, não se devem imaginar facilidades na sua efetiva implantação em qualquer área.

Despreparo nos municípios

Hora de falarmos novamente nas Prefeituras e de seus novos ocupantes ou daqueles reeleitos para um novo mandato.

A lei previa para o começo de agosto deste ano a entrega, por todos os municípios do país, de seus planos de gestão de resíduos. Segundo o Ministério do Meio Ambiente (MMA), por volta de 560 municípios, ou 10% do total das cidades brasileiras, concluíram e entregaram esses planos. Os municípios que perderam o prazo não terão direito a receber recursos federais e renovar novos contratos com a esfera federal para o setor. Essa questão ficou, portanto, para as novas administrações.

A baixa adesão das cidades pode parecer simples descaso, mas conforme pesquisa da Associação Brasileira das Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe) com cerca de 400 municípios, o problema se deve muito à falta de pessoal qualificado para atender aos requisitos previstos na lei. Afinal, para quem achava que para cuidar do lixo bastava um terreno grande para o seu envio e descarte, a lei veio para colocar ordem e mudar um cenário cada vez mais criminoso e urgente. O lançamento indiscriminado de materiais perigosos e contaminantes sem cuidado ou tratamento compromete o futuro e a saúde das pessoas, entre os seus principais e nefastos resultados.

O fim dos lixões até 2014 em todas as cidades brasileiras, será uma tarefa com enormes dificuldades em se tornar realidade, se a maioria das cidades permanecerem distantes dessa discussão. No lugar dos lixões, os resíduos só poderão ser enviados para aterros sanitários. Mas a realidade atual, segundo o Ministério do Meio Ambiente, é a de que ainda existem mais de 3 mil lixões no Brasil sendo que nada menos de que 60% dos municípios do país despejam lá seus resíduos.

A união faz a força

Em recente workshop realizado pelo Instituto Brasileiro de Administração Municipal (IBAM), no Rio de Janeiro, diversos especialistas apontaram a necessidade de se unirem esforços entre o setor privado e os municípios para que a lei alcance os efeitos desejados. Capacitar gestores, realizar um trabalho integrado de educação e conscientização ambiental, garantir incentivos fiscais e justiça tributária para a cadeia de recicláveis são algumas das tarefas a serem trabalhadas em conjunto. Nesse último item, Mauricio Sellos, coordenador do Programa Jogue Limpo que realiza a logística reversa na cadeia de lubrificantes, apontou durante o workshop carioca, o apoio à indústria de reciclagem como urgente e fundamental. “São necessários incentivos fiscais para a cadeia, para quem faz a logística, para quem recicla e para quem consome o material reciclável, do contrário, poderemos ter um volume grande de material reciclado, mas não ter sua utilização” afirmou Mauricio.

Para as cidades médias e pequenas, os especialistas apontam a formação de consórcios como um bom caminho para a gestão dos resíduos. Assim, as administrações municipais podem unir esforços para a montagem de seus planos, reduzem seus custos, aumentam a escala na coleta de resíduos e garantem melhores contratos com as empresas do setor, entre outros benefícios.

Camilla Passarela Bortoletto, da Abrelpe, apontou que um dos maiores gargalos na gestão de resíduos é o conhecimento técnico sobre o assunto. A ausência de cultura de separação é outro fator complicador na gestão de resíduos.

O Brasil produz 220 mil toneladas de lixo domiciliar, o que representa mais de um quilo por pessoa. Ao menos 90% de todo esse material poderia ser reaproveitado, reutilizado ou reciclado. Apenas 1% acaba sendo aproveitado para ter um destino mais nobre do que o de se degradar e contaminar o nosso ambiente. Mesmo assim, mais de um milhão de pessoas trabalham e sobrevivem da reciclagem desse lixo. Os especialistas calculam que o Brasil deixa de ganhar ao menos R$ 8 bilhões por ano ao não reciclar toda essa grande quantidade de resíduos gerados no país.

E o lixo continua a aumentar

De acordo com o Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil, divulgado pela Associação Brasileira das Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), a quantidade de resíduos sólidos gerados no Brasil em 2011 totalizou 61,9 milhões de toneladas, 1,8% a mais do que no ano anterior. Do total coletado, 42% do lixo acabaram em local inadequado.

O crescimento na “produção” desses resíduos de 2010 para 2011 foi duas vezes maior do que o aumento da população, que ficou em torno de 0,9% no período.

O estudo revela também que, em 2011, foram coletados 55,5 milhões de toneladas de resíduos sólidos. Sendo que 42% desses resíduos foram parar em locais inadequados como lixões e aterros controlados. E, ainda pior, cerca de 10% de tudo o que é gerado acaba tendo destino ainda pior em terrenos baldios, córregos, lagos e praças.

Uma política para chamar de nossa

A PNRS talvez seja uma das primeiras iniciativas que finalmente, enxerguem o mundo como ele é, ou seja, redondo e finito! Afinal como podemos viver e consumir imaginando que tudo, matérias-primas renováveis ou não, possam ser utilizadas sem qualquer controle ou parcimônia, e depois “jogadas fora”! Apesar de óbvios, foi preciso surgir situações críticas na capacidade de armazenar lixo; casos gritantes de contaminação de solo e água e a ocorrência de sérios problemas de saúde pública. Isso tudo acompanhado de estudos apontando a redução substancial e mesmo o esgotamento de reservas de matérias-primas estratégicas, para concluirmos que esse estado de coisas não poderia continuar do jeito que estava.

As cidades, as pessoas e o futuro comum

Toda a sociedade, mas às administrações públicas particularmente, caberá também a tarefa de levar as informações sobre a lei de resíduos para todos os seus cidadãos.

Hoje, se os setores público e privado avançam vagarosamente no conhecimento e na aplicação da lei, o mais grave em todo esse processo está no desconhecimento dos brasileiros quanto à discussão dessa nova e revolucionária política. Sem a participação do consumidor essa equação não fecha! O cidadão é parte integrante e determinante para a viabilização de todo o projeto.

É, portanto, fundamental que as novas prefeituras façam todos os esforços a seu alcance para levar às pessoas, informações sobre os objetivos da nova política e os deveres e direitos nela embutidos.

O poder público pode e deve contribuir, por meio da autoridade que lhe foi investida pela população, para promover parcerias com todos os setores da sociedade na implantação de projetos de educação ambiental em escolas e empresas, acompanhadas de campanhas de esclarecimento, com o apoio e o engajamento vital da mídia local. Tais ações vão contribuir substancialmente para reduzir o abismo informativo entre a lei e a população brasileira.

Reinaldo Canto é jornalista especializado em Sustentabilidade e Consumo Consciente e pós-graduado em Inteligência Empresarial e Gestão do Conhecimento. Passou pelas principais emissoras de televisão e rádio do País. Foi diretor de comunicação do Greenpeace Brasil, coordenador de comunicação do Instituto Akatu pelo Consumo Consciente e colaborador do Instituto Ethos. Atualmente é colaborador e parceiro da Envolverde, professor em Gestão Ambiental na FAPPES e palestrante e consultor na área ambiental.


Fonte: Carta Capital - 31/10/2012